quarta-feira, junho 22, 2011

Vento Leste, entre o deserto e o oásis imaginário

Ele não era apenas um leitor que consumia livros para fazer um resumo sistemático e pré-programado de conteúdo. Tampouco o fazia para dizer ao "mundo" que era culto com sua capacidade de fruição. Buscava a essência, a razão e seus desdobramentos, épicos ou não, de leitura.

Clarice Lispector trouxera-lhe intensa divagação sobre a vida, para perceber as relações e sentimentos na observação do mundo e das pessoas a sua volta, unindo-o significativamente a outras pessoas e a uma delas em especial, o "Vento Leste". Foi através dele que se aprofundava em descobrir um coração. Verde fruto proibido da árvore da vida que sua mão não conseguiu colher naquele tempo.

Um grande mistério ainda pairava entre eles. Nas muitas conversas e encontros, regados a intensas trocas, sempre foi sensível que a amizade, beijos e carinhos pareciam não ser recentes. Sempre foi perceptível uma misteriosa sensação de que se conheciam há séculos. Conheceriam ainda, e intimamente, sentimentos, entre alegrias, expectativas e frustrações.

Por um tempo que ele achou que aquele vento, de natureza divina, que habitava seu pensamento, quisesse ir além. E quis. E foi! Mas recuou sem explicação palpável. Ele, mesmo doído pela negação da tentativa de se construir um caminho, que não saberia onde o levaria e tampouco o importava, não quis perder a companhia do vento e recuou em suas expectativas, que até então, antes da lufada crucial daquelas palavras soltas, era apenas brisa sonhadora de tardes de domingo.

Já era tarde àquela altura. Ele foi levado pelo Vento Leste que arrebentou todas as janelas e proteções. Não conseguia mais sentí-lo como a brisa de uma amizade, mas mesmo assim tentou segurar-se em terra, lançado a espera de um posicionamento e, em meio a rajadas fortes, que trouxerem intensas chuvas a seus olhos, foi de peito aberto ao outros encontros. 

Soubera, de antemão, que a turbulência daquele vendaval não seria fácil de lidar mas, como poucos, sobreviveu em seu convívio, em seu carinho e em suas recordações. Sempre que ventava no seu caminho à leste, perdidos carinhos e afeições típicos de um bem querer maior. Sua própria inconstância e falta de rumo? De fato já havia um outro caminho por onde o Vento queria seguir. Ele já sabia disso, mas seu coração, sempre carinhoso e apaixonado, não. 

Chegaram aquele domingo derradeiro de suas frustrações cotidianas e afetivas. Insensível e sem a menor humanidade, e tal qual fúria da natureza, o Vento Leste não soube responder ao telefone, naquele começo de noite, com um "não posso hoje, estou acompanhado", para preservar um mínimo de dignidade. Levou-os, em minutos, da mais alta felicidade de uma tarde bem vivida, ao mais baixo nível da humilhação.

Ele saiu às pressas daquela tarde carinhosa de sol de outono para que o Vento pudesse se entregar ao prazer da efêmera conquista de seis andares acima naquele edifício, mas que não poderia conceder-lhe nada além do proibido de um jardim de ilusões pois, por infortúnio de sua condição de vida, com as "promessas sagradas de amor eterno", era casado a outro ser humano feminino e tinha com sua prole. O vento tinha sua meia-vida, um meio termo afetivo. Para o outro esta condição nunca lhe bastaria, enquanto uno que era.

Expulso, naquele momento crucial de ter que ir embora às pressas, Ele usou de toda a força interior que lhe restava para traduzi-la numa verborreia de verdades que, mesmo não sendo ouvidas ou compreendidas, esperava ter peso absoluto sobre sua consciência, iluminando-o no caminho que quisesse traçar para seu futuro. 

Neste tempo de sonhos, licores e pudins, em meio a afeto, carinho e proximidade, poucas foram as respostas às mais diversas perguntas traçadas. Tal qual esfinge, que finge não se importar, o Vento Leste continuou a fazer seu remoinho de areia no deserto de sua existência que um dia quisera Ele transformar em oásis imaginário.

Ele foi embora deixando um verde coração partido no infinito e talvez venha apenas a sussurrar, na brisa solitária do oceano que, mesmo assim, compreendera o porque das fortes rajadas daquele vento, que o entedia também, por causa de suas íntimas e únicas passionalidades, em personalidades que talvez somente Clarice, possa traduzir em verbos e predicados, sujeitos que eram a ação contínua do tempo. 

Marcelo [Ciello] Poloni

Saudade,
O carinho é como o vento
que não pode ser visto
mas sempre ao senti-lo
saberá que está lá
No leste




4 comentários:

  1. Protegendo-me do vento leste e fechando o livro de Clarice, fico pensando nesta pessoa que provou do fruto proibido e temo que isso aconteça comigo.
    Não poder provar do fruto que é probido.
    Que nasce numa árvore onde não poderei abraçar o tronco.
    Que está numa terra que não poderei pisar.
    E cuja sombra jamais me protegerá do inclemente sol que esquenta os problemas da vida.
    Medo. Muito medo!

    www.meioameioblog.blogspot.com
    COMO MEU TORNEI UM GAROTO DE PROGRAMA

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  2. Olá menino
    Mais uma vez a sua sensibilidade prevalece. Lindo demais.
    Bjão

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  3. Lendo seu perfil.
    Meu anjo de forma alguma você é um pacato cidadão.
    E sim um ser humano lindo da qual ofereço minha amizade e carinho.
    Vi você no blog do meu querido Wandereley.
    sua postagem arrebenta em sensilibilidade vou um prazer enorme encontrar você.
    Estou seguindo seu blog deixando convite para seguir o meu creio que seremos bons amigos beijos com muito calor humano porque o tempo esta frio onde moro.

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Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade. Entender é uma criação, meu único modo. Clarice Lispector.

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